quarta-feira, 10 de setembro de 2008

RIBEIRA QUENTE - ASPECTO CULTURAL 1



De uma forma geral, ainda na primeira metade do século passado, os jovens do meio rural estavam condicionados a uma só etapa do caminho da evolução cultural literária.
Atingir um diploma da 4.ª classe da instrução primária era o vértice que se tornava prémio para quem o obtinha, e uma grande satisfação para os pais que nunca o tiveram.
Escolas secundárias, então uma só em Ponta Delgada. As intermediárias também eram inacessíveis devido às mesmas dificuldades sociais de então.
Os pais mais futuristas, quando podiam desviar dos seus fracos recursos algumas economias, mandavam os filhos para o então grande meio que era Ponta Delgada, porque só ali estes podiam transpor a barreira do limitado, e ir mais além em busca de outros sonhos profissionais-culturais.
O ensino intermediário que despontava em Vila Franca do Campo, embora não fosse oficializado, foi parcialmente positivo mas não isento de encargos para os pais dos jovens que vinham de zonas distantes. É que as instituições religiosas também tinham barreiras estanques.
Para alguns jovens do meio rural, depois de concluída a instrução primária, a entrada no Seminário de Angra era uma grande alternativa quando haviam alguns recursos, vontades e auxílios, porque, mesmo falhando as vocações por razões de ordem diversa, os graus de relativa equivalência, embora ainda não igualitários, já permitiam a abertura de muitas portas de promoção.
Quando estavam fechados todos os condicionalismos de promoção social, os pais viam-se obrigados a ensinar as suas profissões aos filhos, por obrigação rotineira.
Os filhos viam-se obrigados a herdar a profissão dos pais, isto com pequenos desvios nas profissões liberais de não grande disparidade. Até mesmo quando os pais exerciam profissões de função pública, em alturas adequadas, estes preparavam os filhos - quando os mesmos possuíam o grau de instrução primária, o tal diploma da 4.ª classe (houve uma 5.ª não durável) - e colocavam-nos nos seus lugares, quando reformados. Para tal bastavam umas antecipadas bajulações e vénias que eram aceitas como formalidade normal.
Naquela altura em que não existiam concursos públicos fosse para o que fosse na função pública, apenas prevalecia o sentimento convicto do normal acto de locação hereditária. Por esta via não ficavam sensibilidades feridas nem sinais de imoralidades exacerbadas.
Como é facil de compreender, a Ribeira Quente era uma terra de pescadores e trabalhadores não classificados, por isso os filhos desta localidade sempre tiveram horizontes limitados.
Como já ficou atrás referido, quando o Padre José Jacinto da Costa conseguiu elevar o lugar da Ribeira Quente a freguesia, a oposição foi forte por parte dos intelectuais da Vila da Povoação, os quais não acreditavam que, na Ribeira Quente houvessem homens capazes de reger uma então simples Junta de Freguesia!
Historicamente, e independentemente de quaisquer dotes de inteligência, tanto Vila Franca como a Povoação entendiam que o povo desta localidade tinha de permanecer eternamente montano e êxul como o foi na sua forma primitiva, embora já fosse, nesta altura da década de quarenta do século XX, um povo capaz de ser gestor dos seus reduzidos recursos.
Mas, para que este período se torne mais elucidativo, é lógico que se mencione o seguinte:
As 4.ªs classes de então, continuadamente trabalhadas, produziam valores inegáveis quer no campo particular quer no oficial (função pública do meio rural). Por isso é que, ainda esta mencionada primeira metade do século passado, nas repartições públicas da Vila da Povoação, nomeadamente na Secretaria Notarial, Registo Civil e Conservatória do Registo Predial, os ajudantes - alguns a desempenhar em periodos longos, os lugares de conservadores - foram profissionais competentes, embora só possuíssem a instrução primária!
O primeiro ajudante do posto do Registo Civil da Ribeira Quente, só possuía essa habilitação literária.
Este posto foi extinto já no período do actual pároco, por se verificar que, por razões óbvias, o mesmo não era viável.
O Padre José Jacinto da Costa - mais conhecido na Povoação por Sr. Padre Mansinho mas, na Ribeira Quente, devido à linguagem idiomática do povo desta localidade, por O SIM PADRE MINSINHO procurou, naquela altura, alterar o curso histórico do anómalo comportamento deste povo subalterno quando posto perante situações de arrogância administrativa. Porém as mudanças foram notórias mas não substânciais devido à situação política prevalecente.
Foi nesta situação de fechado grau cultural, ou limitado grau cultural, que o então jovem Padre Silvino veio encontrar a comunidade da Ribeira Quente.
Embora já levemente melhorada por um edifício escolar do "PLANO CENTENÁRIO", ainda assim continuavam muitas crianças a não ir à escola porque a sua sobrevivência e dos seus familiares dependia mais do trabalho do que da escola - e isto não era por egoísmo dos pais mas sim por velada necessidade.
A abertura dos túneis, embora se julgasse que sim, não alterou certas situações - continuou a não haver transportes colectivos de passageiros para esta localidade porque o povo era muitíssimo pobre - por isso o mesmo continuou a ser um povo fechado no seu limitado espaço vivencial, a do mar largo e pouca terra que lhe não permitia mais do que os mesmos ressequidos lugares.
Historicamente, até então, nesta freguesia só haviam surgido depois da instrução primária, duas vocações sacerdotais; uma que se não completou por razões de força maior, e um professor de instrução primária.
Vendo esta situação de travamento sócio-económico e sócio-cultural, o Rev. Silvino procurou alterá-la.
Apostando numa visão sua, a qual veio a dar frutos positivos, começou a trabalhar a juventude da Ribeira Quente, incorporando-a no Corpo Nacional de Escutas através do Agrupamento 107 de Ponta Delgada - no concelho de Povoação depois do agrupamento da Mocidade Portuguesa fundada na década de 30 do século passado, (durou pouco) mais nada houve em matéria de acção cultural. por isso a Ribeira Quente ficou a ser, nessa altura de filiação escutista, a pioneira do primeiro grupo ecutista no mesmo.


A Acção Católica Rural foi outro passo dado pelo Padre Silvino, a fim de sacudir o pesado marasmo incultural de sempre. É que este sabia, dado os conhecimentos da sua formação, que a formação espiritual tem sempre uma linha paralela que deve ser colmatada, a formação cultural, porque só a partir desta se pode penetrar na vida de recursos materiais indispensáveis.
De referir neste trabalho que dos muitos grupos da Acção Católica Rural na Ilha de São Miguel, subsistiram até aos dias de hoje as Secções da Ribeira Quente, Ribeira das Tainhas e Vila de Rabo de Peixe. O Padre Silvino continua hoje a ser o Assistente Espiritual destas Secções. Não podemos também deixar de referir que em Outubro de 2004 em Assembleia de Ilha da Acção Católica Rural foi eleito para Presidente da Acção católica na Ilha de São Miguel o filho desta terra Márcio Paulo Pimentel Peixoto e reconduzido no mesmo cargo em Assembleia de Ilha realizada em Julho de 2007.

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