segunda-feira, 1 de setembro de 2008

EMIGRAÇÃO E DESPOVOAMENTO DA RIBEIRA QUENTE


Devido ao fenómeno eruptivo ocorrido em 1957/58, na ilha do Faial, surgiu dentro da Comunidade Açoriana da América do Norte um grande movimento de solidariedade humana.
Este movimento não tinha, em primeiro plano, como finalidade, o costumeiro hábito de angariação de roupas, géneros alimentícios ou grande verbas em dinheiro, mas sim, procurar, dentro da sua limitada capacidade de influência sócio-política, fazer algo para que o então muito influente senador estadual pelo Estado de Massachusetts, John F. Kennedy - que viria a ser o malogrado 35.º Presidente dos Estados Unidos da América - fizesse passar na imensa câmara legislativa federal, no senado, uma Lei de Imigração Excepcional que permitisse aos atingidos pelos acontecimentos sismo-eruptivos do Faial, a concessão de um visto de entrada com fins permanentes nos Estados Unidos fora da quota que era atribuída anualmente a todo o território português incluindo o então colonial.
Dentro do contexto lógico das leis de imigração americanas, Portugal não era um país de concessão de vistos preferenciais, porque o emigrante português não era preferencialmente classificado, mas sim um emigrante que procurava recursos de sobrevivência não obtidos na sua pátria. Mas a Colónia Açoriana na América era relativamente grande, não por ter sido criada originalmente ao abrigo de leis legais, mas sim pela livre opção de fuga.
Note-se: ainda naquela altura da erupção, o número de vistos de emigração que eram concedidos anualmente a Portugal (para toda a sua extensão territorial, incluindo a colonial), era da ordem dos 300 vistos que logo eram absorvidos pelas primeiras preferências; cônjuges, pais e filhos menores, os quais, quando o chamamento não era feito por cidadão americano, natural ou naturalizado, a concessão de um visto de entrada podia levar alguns anos.
Mas, embora não sendo a Comunidade Açoriana da América uma grande comunidade de lingua portuguesa dentro do imenso espaço linguístico da América, na verdade, nas zonas de maior densidade de gente nossa como por exemplo nas cidades de New Bedford e Fall River, onde a comunidade mais se identificava, já existiam então algumas influências políticas de origem açoriana, ou mista, que abiam ir buscar ao lugar certo, uma mão caridosa para certas situações relevantes.
Os órgãos de comunicação social falada ou escrita, como o então diário "Portuguese Daily News", deram a necessária dimensão da tragédia e, de tal modo o fizeram, que atá o "Standard Times" - grande jornal que se publicava duas vezes diariamente, em New Bedford - também se envolveu no acontecimento por ester perfeitamente dentro daquilo que significava a comunidade de língua portuguesa naquela sua área.
Devido à intercessão do então senador John F. Kennedy, não só os sinistrados dos Capelinhos vieram a usufruir de fáceis vistos de entrada naquele imenso país americano, como também todos os cidadãos do território português. É que, dali avante, o número de vistos anuais não consumidos pelos países desenvolvidos da Europa, passaram a ser proporcionalmente divididos por nações como Portugal, Itália e Grécia, países nunca beneficiados pelas leis de imigração americanas.
Como já foi referido, desde há muito, ou pelo menos desde fins dó século XIX, existia em New Bedford, um número significativo de filhos da Ribeira Quente e descendentes destes, alguns já cruzados com gente de outras origens.
De certo modo estavam quase circunscritos à parte sul desta cidade americana, mais precisamente entre a Rua Rivet, a norte, a Cove Road (estrada) a sul, County Street a nascente e Crapo Street a poente.
Esta zona citadina ainda na década de 50 era uma zona profundamente delapidada, onde existiam muitas habitações em estado de ruína.
Porque o povo do lugar da Ribeira Quente de forma alguma vislumbrava algo que no futuro pudesse vir a alterar a sua difícil situação social, aproveitando a oportunidade da concessão de fáceis vistos para as antigas cartas de chamada, que jamais podiam ter sido váliadas se não tivessem acontecido as ocorrências do Faial, por essa razão foi emigrando, como o fizeram então muitos açorianos.
Notoriamente, a sua fização na América, foi sendo feita na zona atrás mencionada, mais precisamente nas ruas Independent, Katherine, Winsor, Mosher, Division, Jouvette e Nelson, ruas estas enquadradas nos quarteirões existentes entre as ruas e estrada atrás mencionadas.
Esta foi sendo lentamente recuperada; muitos dos imigrantes oriundos da Ribeira Quente fizeram-se proprietários de casas; alguns estabeleceram-se com comércio de produtos do mar, mas depois também de outros.
Nota curiosa: foram aparecendo nesta área alguns pequenos quintais que tinham sido jardins desde há muito abandonados. O pé de milho, a couve e a salsa, eram o bilhete de identificação de origem!
Como já foi referido, no ano de 1965 a população desta freguesia havia atingido o ponto culminante da sua história populacional, 2.421 habitante.
Era a maior densidade por quilometro quadrado nos açores.
Cinco anos depois, devido ao fluxo migratório, a sua população já era da ordem dos 1.861 habitantes. Tinha perdido, este pequeno meio, 560 pessoas.
Depois disto, e já no recenseamento feito no ano de 1991, aparece a população desta localidade drasticamente reduzida para apenas 998 pessoas.
Este vultuoso desmembramento do corpo social de modo algum prejudicou a vida económica desta comunidade; pelo contrário, tornou-se a correcção certa de uma coisa que estava humanamente mal, a de ter a Ribeira Quente, que era um restrito espaço, muitíssima gente a mais.
Materialmente nada perdeu este povoado. Socialmente, também não. Antes pelo contrário, como se veio a verificar, este acontecimento foi algo como um ajuste concedido por acção divina: quem partiu melhorou substancialmente a sua vida; quem ficou veio a verificar que, por razões óbvias, muita coisa se alterou significativamente em prol da Ribeira Quente por motivo da reocupação das casas abandonadas.
A Igreja de São Paulo perdendo paroquianos não os perdeu, porque nasceu um forte elo de ligação que deu continuidade ao apego dos ausentes ao seu padre e à sua igreja, mantendo esse laço de amizade sempre forte e indestrutível.
E isto é uma indesmentível característica do povo da Ribeira Quente.

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